sábado, 30 de setembro de 2017

da doença por falta de casa

como boa falante de português orgulhosa, sou muito apegada à palavra saudade. mesmo depois que descobri que em hebraico também existe uma palavra para isso, inclusive com plural e singular, continuei vendendo o discurso da palavra que é só nossa. mas, mesmo os soldados mais ferrenhos da língua portuguesa devem se render às vezes, diante da boniteza de outra língua. 

a palavra que vem ganhando meu coração é homesick

esses dias uma pessoa me apresentou a um brasileiro dizendo: queria que você conhecesse ela, porque no ela esta homesick. eu disse que nããão, eu não estava homesick e curiosamente minha voz atingiu um tom um tanto agudo. na minha cabeça a definição era muito pesada praquilo que eu sentia em relação ao Brasil. 

primeiro, porque existe uma questão cognitiva. a gente entende algo novo por comparações com aquilo que já conhece. eu vivo significando minhas impressões, visões e ideias com frases que começam com "no Brasil...". e parece que você de fato entende e aceita algo quando consegue estabelecer raciocínios baseados apenas na realidade que está vivendo. mas isso não é saudade.

depois, ficava o peso da palavra doente embutida quando me diziam homesick. não me pergunte por onde, mas me vinha a imagem de soldados em um trincheira lendo as cartas de alguém amado. passado um tempo, porém, me dei conta que a palavra não tinha essa carga. mais que isso, percebi que descrevia com precisão um sentimento central na substância de ser estrangeira. 

é que sick, além de doente, pode ser enjoado, mareado. aquela sensaçãozinha de fundo que não é das dez mais agradáveis mas não te impede de viver. as vezes te empurra mais pra viver, vai saber. morre aquele misto-de-tédio-e-preguiça que as vezes estar em casa nos dá. nascem deslumbramentos, surpresas, curiosidades, desafios. nasce um desejo de ficar nesse lugar que te transborda de novo.

mas fica faltando um calorzinho no coração. um que não está lá, vai saber, quando você se senta no ferry boat e olha pro mar. você está voltando de um dia de viagem lindo. você botou os pés no mar e até sentiu que aquele seu ponto-pacífico-que-fica-no-atlântico veio junto com você na mala. afinal, é o mesmo mar. mas aí você senta no ferry boat e pensa: me falta aquele colinho. 

um colo que não é de uma pessoa só. mas de uma série de amores que ficaram pra trás. aqueles amores despretensiosos que brotam numa amizade de longa data e olhar profundo. coisas que você não sabe como serão nesse lugar novo, mas que sabe que não serão como antes.

e não é tristeza, ainda que possa virar. é mais um gostinho bom de amore e saudade. é uma condição que, você entende, vai te acompanhar. sempre. vai te lembrar que ter asas é fundamental, mas você nunca vai deixar de ter raízes. 





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